Entrevista com Janice Salomão sobre a pessoa idosa no Terceiro Setor

Janice é Diretora Executiva do GEAA e da Conviver Saber Social, Diretora do IMF e Conselheira do CeMAIS. Ela é professora e educadora. Formou-se em História, fez MBA em Gestão Educacional e possui vários cursos de especialização na área pedagógica e social. Atualmente, é mais especializada na área do Terceiro Setor, principalmente em Gestão Estratégica, e está especializando-se na Gestão da Felicidade. Estudando a Ciência da Felicidade para levá-la até as pessoas, cidades, empresas e organizações.

Confira a entrevista que nós fizemos com ela sobre a participação da pessoa idosa no Terceiro Setor:

 

1) Como você conheceu o Terceiro Setor? Há quanto tempo você trabalha/atua em organizações sociais?

Conheci o Terceiro Setor assim que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi aprovado, em 1990. Em 1993, o programa Ação da Cidadania começou, formando comitês de combate à fome e à miséria. Até então, o Terceiro Setor ainda não existia como Terceiro Setor, existia muito assistencialismo e organizações religiosas na área. Com o tempo, as organizações sociais pararam de ser assistencialistas e passaram a valorizar a promoção da pessoa. Dar oportunidade para as pessoas saírem de um lugar de vulnerabilidade. Eu participei de diversos conselhos, fóruns e comitês, e, em 2003, passei a fazer parte da Conviver Saber Social, organização que trabalho até hoje.

 

2) Na sua história de vida, em que momentos as organizações sociais estiveram presentes? Quais os fatos marcantes da sua história que estão ligados à sua atuação no Terceiro Setor?

Eu sempre fui militante e ativista, fiz parte de algumas lutas. Quando entrei na Universidade em 1968, lutávamos por liberdade. Com a mudança da Constituição em 1988, vimos que precisávamos lutar por direitos. Quando tive um contato mais próximo com a questão da miséria e da fome, o meu propósito foi garantir o direito das crianças e adolescentes. Um dos momentos mais marcantes para mim foi quando 700 crianças e alguns adolescentes ocuparam o Congresso Nacional pedindo a promulgação do ECA, em 1989. Pedindo que fossem vistos como sujeitos, não “pivetes”.

Outro momento muito marcante foi em Brasília, quando a gente conseguiu que o dia 18 de maio fosse o Dia Nacional de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes.

 

3) Na sua opinião, qual o papel e o poder da sociedade civil organizada?

Vivi e vivo da revolução. Considero necessária. Sem nós do Terceiro Setor, essa sociedade não existiria. Se não houvesse uma intensa participarão da sociedade civil, não existiríamos como país, seríamos ainda uma colônia dos países desenvolvidos. Na área de saúde, assistência, defesa das mulheres, dos idosos, dos direitos... ainda temos muitos problemas, mas imagina se não existíssemos? É preciso paciência e competência. Precisamos de diálogo. Apostar em inovação, avanços, trabalhar dados, saber comprovar o lucro do nosso trabalho. Promover a comunidade, pois a comunidade gera luta.

Nós vimos no ENATS a Marciele falando da importância da CUFA. Do trabalho da CUFA em gestão, avaliação, monitoramento de impactos. A participação é fundamental.

 

4) Quais os progressos na garantia de direitos e na profissionalização do Terceiro Setor que você pôde observar durante a sua atuação?

Eu acredito que hoje se a gente considerar no Terceiro Setor a área da saúde, por exemplo, mostrou com pandemia, mesmo não estando preparada pra esse momento desastroso, que os hospitais públicos, que eram do Terceiro Setor, tiveram uma gestão da crise muito mais adequada do que os hospitais governamentais, um grande avanço na área da saúde.

Eu vi o SUS nascer. Embora seja um programa do Governo, nós do Terceiro Setor soubemos valorizar esse programa.

Para mim, o maior avanço que houve foi a participação da sociedade civil nos Conselhos, porque podemos deliberar política. um Estatuto que ouve participação. A Lei Maria da Penha existe porque houve essa participação nos Conselhos. A sociedade se impôs para que a gente tomasse a defesa do direitos das pessoas negras também. Eu vejo muito avanço nos Conselhos. E isso tudo resultou em legislação.

 

5) As pessoas idosas estão presentes no dia a dia das organizações sociais como público atendido e também como trabalhadores e voluntários. Qual a importância do terceiro setor para a ocupação e realização profissional da pessoa idosa?

Temos uma sociedade que ainda tem algum preconceito contra o idoso, tratam como se a pessoa que aposentou se tornasse inválida. A sociedade não vê toda a história que essa pessoa já construiu. O Terceiro Setor percebe melhor a sabedoria que essas pessoas adquiriram. São pessoas mais resilientes, mais equilibradas. A idade vai trazendo resiliência. Já viveram uma história em que não tínhamos essas garantias que temos hoje, por isso temos críticas mais avançadas às lutas atuais, por termos estado presentes nessas lutas.

Eu tenho 70 anos e considero que ainda tenho tempo para oferecer, eu continuo aprendendo, continuo buscando coisas que dão mais chances ao meu propósito. Muitas pessoas idosas contribuem valorosamente no Terceiro Setor, e se veem incluídas, porque valorizamos a sabedoria dessas pessoas, embora essa distância geracional provoque um hiato. Por exemplo, embora eu conheça muito sobre a primeira infância, eu não acho que seja adequada para fazer esse trabalho diretamente com as crianças de 6 anos, porque eu já não tenho a mesma mobilidade e vitalidade que um jovem tem para estar presente com aquele grupo de crianças. Mas eu tenho o conhecimento que aquele jovem ainda não tem, para ensiná-lo a fazer esse trabalho. Os idosos são muito importantes e efetivos em fazerem um trabalho de capacitação, serem conselheiros das organizações. Eu quero continuar até os 90 sendo conselheira!

 

6) Se fosse para escolher uma ou duas palavras para representar o seu percurso na área social, quais seriam?

Gratidão e justiça são as palavras mais fortes no meu percurso. Quando eu era uma menina de 12 anos até hoje sempre fui muito movida pelo senso de justiça e muito grata.